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O PROJECTO

     Todas as lendas têm algo de místico e de deslumbramento, e elas sobrevivem e se proliferam precisamente por que apelam ao nosso mais profundo imaginário. A lenda do Judeu Errante teve origem na Idade Média e faz hoje parte da mitologia cristã, popularizada ao longo dos últimos cinco séculos através de inúmeras obras de alguns dos mais destacados artistas, e não só escritores, como também pintores, cancioneiros, dramaturgos e compositores.



     A imortalidade é algo que a todos fascina, sendo o reverso da imutável finalidade da nossa existência, e todas as religiões a utilizam como chamariz e promessa. O ser humano não consegue se resignar à sorte dos outros seres vivos e acredita que algo mais lhe é devido só pelo facto de existir e pensar. Acredita que a sua superioridade intelectual, quando comparada com todos os outros seres, lhe dá o direito de uma vida eterna, mais que não seja uma pós-existência espiritual. Mas esta promessa tem custos que variam de religião para religião, e que invariavelmente têm tudo a ver com a postura e conduta moral dos crentes.



     E se então esta promessa só é válida para os justos e os moralmente sãos, como entender a lenda do Judeu Errante ?  Como é que a maior dádiva possível para um ser humano (a eternidade) foi dada pelo próprio filho de Deus a um homem imoral como geralmente ele sempre foi caracterizado ? E não esqueçamos que a lenda  surgiu numa época de frenesim religioso como foi a Idade Média. 

     Esta minha versão do Judeu Errante nasce de uma ideia em associar os principais pecados da virtude cristã (anátemas da moral de qualquer crente) à história dos últimos 2000 anos. Através destas narrativas assiste-se a mais do que o simples amadurecimento de um homem sem idade. No fundo é a evolução da nossa própria sociedade condicionada por uma moralidade mutável, e muitas vezes questionável, que tem a sua origem no dogma cristão.

     Eterno mesmo parecem ser os pecados, não o homem, nem os dogmas e muito menos as virtudes ou a moral.

 

JUDEU ERRANTE

O SECULÁRIO DE UM

Uma História em Sete Pecados

A Inveja

Livro 1

     Este é o primeiro livro do diário/seculário de Ausero ben Simão,  o Judeu Errante, e cobre a situação social e os acontecimentos na Judeia desde o ano 33 da Era Comum até à destruição do Templo em Jerusalém e a subsequente diáspora judaica (83 e.c.).

     A estória tem inicio com a chegada do profeta Josué à cidade, a sua perseguição, julgamento e morte. A partir deste evento, acompanha a criação do movimento apostólico e a sua gradual dispersão por várias geografias, numa narrativa fatual, alicerçada na convicção do narrador da heresia daquela nova seita religiosa.

     Interagem conhecidas figuras históricas cristãs e judaicas, além de romanos, gregos e sírios, numa ótica desprovida do misticismo que muitos destes ganhariam mais tarde no panteão judaico-cristão.

     Ao longo da estória fica patente o crescente desespero do narrador, inexplicavelmente fadado a não envelhecer, apontado como alvo de um milagre concedido por um judeu executado por heresia e sedição.

     Invejado, fugitivo do ostracismo dos seus pares e procurado como a prova viva do poder divino de um messias em quem nunca acreditou, Ausero acaba assistindo à quase aniquilação da sua religião milenar ao mesmo tempo que vê crescer a popularidade de um obscuro culto messiânico.



Neste primeiro livro, os acontecimentos narrados são por todos conhecidos, no fundo estamos no momento em que é fundada a religião cristã e não falta material de sobra sobre este período. Curiosamente, não se encontram fontes da época de historiadores de renome que nos descrevam em grande detalhe o profeta Josué/Jesus. Aquilo que chegou ao nosso conhecimento, para além dos relatos dos evangelhos, são textos do segundo e terceiro séculos e todos estes impregnados de misticismo cristão. Mesmo os evangelhos, que segundo os mais recentes estudos, surgiram a partir do ano 70, são em muitos aspectos contradictórios, especialmente na questão da vida de Jesus antes de se tornar conhecido como pregador. 



Tendencialmente, este livro é o mais leve de todos em termos filosóficos, pois é também o primeiro que aborda a vida do Judeu Errante como mero humano, ainda não condicionado a uma experiência de vida cronologicamente superior à dos seus pares.  Nesta narrativa assistimos a episódios familiares de todos, um filho, um casamento, a sua carreira, os seus prazeres mundanos, os seus gostos e desgostos, e as suas ambições. Tudo ainda  muito humano.



 

A Luxúria

Livro 2

O segundo livro avança 220 anos depois do final do primeiro, e já não encontramos Ausero. Agora o Judeu Errante se chama Kartafilos e é um arquitecto ao serviço do imperador Diocleciano, o mesmo que emitiu o edital contra os cristãos em 303, precisamente o ano em que começa a narrativa e também a chamada era dos mártires, que só terminaria dez anos depois com o edital de Milão, promulgado pelo primeiro imperador cristão, Constantino.

Mais do que a era das perseguições e do chamado Dominato do Império Romano, esta época assinala a decadência do paganismo pelo mundo de então, mais tarde reanimado sem sucesso pelo imperador Juliano.

Agora com 300 anos de idade, o Judeu Errante assiste a uma época de contrastes. Primeiro vê os cristãos perseguidos e aniquilados pelos romanos, enquanto aos judeus ainda são concedidas as liberdades cívicas e religiosas (pelo menos aos que pagam o imposto judaico). Muitos poucos anos depois, assiste à gradual cristianização do império Romano com tudo o que isso implica em termos sociais e religiosos.

E quanto a ele ? Kartafilos ainda acredita que não é imortal, apenas um homem com uma longevidade longa, que nem os antigos profetas da sua Judeia, e como mero mortal, sujeito às vicissitudes de todos, acabando por se apaixonar por uma mulher 280 anos mais nova do que ele.

O livro termina com a morte do imperador Constantino em 337 enquanto Kartafilos se ocupa da construção de Nova Roma, futura Constantinopla.

 

 

A Soberba

Livro 3

O terceiro livro passa-se no séc. XI e cobre o período das primeiras cruzadas, numa época de aguerrida militância religiosa. Neste livro, o Judeu Errante regressa à sua Judeia depois de mais de mil anos de ausência e depara-se com uma sociedade sem judeus e onde, mais uma vez, uma nova religião se enraíza, o Islamismo.

O cristianismo é agora a religião dominante em todo o mundo ocidental, e contrário aos mandamentos do seu fundador, é uma religião ainda mais prepotente e beligerante do que alguma vez foi a sua própria religião judaica. 

 

 

A Ira

Livro 4

 A Ira, o quarto volume, é passado na época da Peste Negra (séc. XIV), considerada na altura como sinal claro da ira de  Deus contra a iniquidade dos homens de então. Neste volume, assiste-se ao nascimento de uma nova Europa sobre o jugo do Sacro Império Romano, abençoado pelo papado de Roma e unido pela força das armas.

O cristianismo já não é só uma religião, é agora também o alicerce do poder temporal.

 

 

A Gula

Livro 5

O quinto livro leva-nos até ao séc. XVI, a era do apogeu do Vaticano como força militar e politica. É a época das indulgências e dos excessos dos papas-principes, e entre estes destaca-se Leão X. É também a era de Lutero e do Reformismo, e os acontecimentos que têm origem na Saxônia vão afectar para sempre a sociedade europeia e o restante mundo ocidental. 

 

 

A Ganância

Livro 6

A Ganância trata o período da colonização dos novos mundos descobertos pelos grandes navegadores espanhóis e portugueses por parte dos grandes poderes ocidentais (Inglaterra, Espanha e França). É a era das evangelizações jesuíticas e protestantes. É a época das escravizações de povos e da exploração das riquezas naturais. É a era dos grandes banqueiros judeus e também do Iluminismo.

 

 

A Indolência

Livro 7

Estamos na era moderna (séc. XX) e o Judeu Errante há muito que não tem dúvida da origem divina da sua imortalidade. As ciências, a genética e o todo o actual conhecimento humano não conseguem explicar a sua longevidade. Resta-lhe agora esperar pelo prometido, numa época onde o divino é cada vez mais questionado e onde a moral e os costumes menos coincidentes com os seus principios. É a era do materialismo, das aparências e da pressa. Não é uma época para heroísmos e de moralidades altruístas. É uma era de indolência moral e de preguiça espiritual onde a religião dominante é o consumismo.

 

 

seculário
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